terça-feira, 12 de janeiro de 2010

Médicos de paciente que morreu em hidrolipo são hostilizados em delegacia

Clima ficou tenso no local, onde familiares acompanhavam movimentação.
Em depoimento, um dos médicos admitiu falta de especialização.

Aluízio Freire Do G1, no Rio

Foto: Aluízio Freire/G1

Médicos Marco Antonio e Daniela Fernandes são agredidos na saída da delegacia (Foto: Aluízio Freire/G1)

Os médicos Marco Antonio Raposo e Daniela Fernandes, responsáveis pela operação de hidrolipo que resultou na morte da radiologista Carla Bastos Fares, de 33 anos, foram hostilizados na noite desta terça-feira (12) por familiares da vítima ao deixarem a delegacia, na Baixada Fluminense, onde prestaram depoimento.

O clima foi de muita tensão no momento em que os donos da clínica saíram. Um cunhado da vítima chegou a jogar urina nos médicos. Ele foi contido pelos policiais. Mais cedo, a irmã da vítima, a professora Nícia Bastos Fares, 31, ao ver a médica Daniela passar pelo corredor da delegacia, não se conteve e começou a gritar: “Assassina, assassina”.

Em depoimento, o médico Marco Antonio Raposo, 47, admitiu que não possui especialização em medicina estética. Ele fez a declaração em depoimento de quase três horas ao delegado Antônio Silvino, titular da 59ª DP (Duque de Caxias).

Segundo o delegado, Marco disse que é formado em medicina desde 1985, possui especialização em medicina ortomolecular, medicina do trabalho, cardiologia e anestesia. Ele afirmou ainda que concluiu um curso de medicina estética pelo Colégio Brasileiro de Cirurgia e Medicina Estética há um ano, mas não obteve o diploma porque não entregou a monografia.

"Portanto, não poderia exercer a função", disse o delegado, que pretende indiciá-lo por homicídio culposo (quando não há intenção de matar), cuja pena é de 1 a 3 anos.

De acordo com o delegado, o médico tentou desconversar quando lhe foi perguntado se não achava arriscado retomar a terceira fase da cirurgia já que, no último procedimento, Carla teria reagido mal, tendo alucinações e reclamado de dores.

“Num primeiro momento, ele disse que não se recordava de que seria a mesma paciente. Quando insisti na pergunta, alegou que, como se tratava de uma cirurgia reparadora de pequeno porte, resolveu fazer. No mínimo, foi um ato de imprudência”, afirmou Antonio Silvino.

Marco também admitiu as condições precárias da clínica MedLight, que não tinha todos os equipamentos necessários para realizar esse tipo de cirurgia, mas minimizou a falta de um desfibrilador. “Ele disse que se tivesse seria bom, mas não fazia tanta falta”, afirmou o delegado.

Daniela Barbosa Fernandes, 35, contou ao delegado que possui especialização em ginecologia, obstetrícia e medicina estética. Ela ficou de apresentar o diploma na próxima semana.  Ela afirmou ainda, em seu depoimento, que na segunda cirurgia Carla teria "apresentado problemas emocionais e não clínicos".

"Para ela, outra coisa que pode ter gerado problema é o anestésico se a paciente usou algum medicamento antes do procedimento", afirmou o delegado, reproduzindo a versão do depoimento da médica.

Clínica fica na Baixada Fluminense

O procedimento médico foi realizado numa clínica em Duque de Caxias, na Baixada Fluminense. Na segunda-feira (11), médicos alertaram para o risco das cirurgias estéticas em clínicas despreparadas.

A hidrolipo é um procedimento feito em consultório, no qual é injetada uma substância que faz com que as células de gordura fiquem maiores, facilitando a realização da lipoaspiração dessas células.

Há três meses, uma outra mulher procurou a mesma clínica para também fazer uma hidrolipo. A paciente, que não quis se identificar, disse que até ficou satisfeita com o resultado, mas não gosta de lembrar do nervosismo na hora da operação.

“Eu fiquei preocupada de acontecer alguma coisa comigo, por não ter um centro cirúrgico lá, um equipamento legal”, disse.

Na internet há dezenas de anúncios de clínicas e profissionais que trabalham com hidrolipo. Alguns prometem tratamentos inovadores, outros utilizam frases de efeito para seduzir possíveis clientes.

Família quer justiça

A família da radiologista Carla Fares quer justiça. A irmã contou que, durante a segunda cirurgia, a médica não quis fazer o procedimento porque Carla estaria com alucinações, e os médicos não realizaram o serviço pelo qual Carla tinha pago. “A médica ligou para a casa da Carla e disse que ela estava com um processo espiritual, que precisávamos levá-la para uma igreja”, disse a irmã.

Mesmo assim, Carla insistiu em terminar o serviço, e retornou à clínica. “A Carla foi a um consultório fazer uma hidrolipo e já saiu de lá em coma. Ela teve uma parada respiratória”, contou Nícia. Ela explicou que o procedimento foi realizado no dia 6 de janeiro, por volta de 19h30.

Carla argumentou em casa que iria à clínica buscar o ressarcimento do valor pago para a cirurgia que não tinha sido feita, já que a família a desaconselhava a fazer a lipo novamente.

Dez minutos sem respirar

A vítima foi levada para um hospital na Baixada e no dia 8 transferida para um hospital na Zona Norte da capital. Segundo Nícia, a clínica em que Carla tentou fazer a lipo apresentou um prontuário, dizendo que ela teve dois minutos de parada respiratória e que eles não teriam iniciado nenhum processo cirúrgico no corpo de Carla.

Segundo a irmã, foi omitida a informação da traqueostomia e não foram explicadas as duas perfurações na região das costas.

G1 > Edição Rio de Janeiro

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