domingo, 1 de junho de 2008

Álvaro Lins: encoberto por ‘laranjas’

Relatório da Polícia Federal indica que o deputado estadual Álvaro Lins utilizou nome de parentes para dissimular a evolução de seu patrimônio a partir de 2002. Seu sogro foi libertado sexta-feira

Maria Mazzei

Lins foi detido quinta-feira e solto no dia seguinte: revogação da prisão foi aprovada pela Alerj. Foto: Banco de imagensRio - Para ocultar um padrão de vida luxuoso, incompatível com a renda de R$ 7.237,59, o deputado estadual Álvaro Lins, ex-chefe de Polícia Civil, escondeu seus bens, colocando-os em nome de ‘laranjas’, principalmente parentes. Relatório da Polícia Federal (PF) encaminhado ao Tribunal Regional Federal (TRF) revela que, depois de 2002, quando assumiu a chefia, houve “brutal evolução patrimonial dos laranjas em total dissonância com a evolução de seus rendimentos”. No fim da noite de sexta-feira, o sogro de Álvaro, o vereador Francis Bullos, deixou a prisão, após conseguir alvará de soltura do TRF.

Segundo a PF, Lins “lançou os seus tentáculos nas entranhas do governo do Estado do Rio de Janeiro, lucrando com a corrupção e com a ineficiência no combate ao crime organizado” durante os governos de Anthony Garotinho e Rosinha Garotinho. A Corregedoria da Assembléia Legislativa quer interrogar Lins.

A PF levantou os bens existentes em nome de parentes de Lins a partir de uma planilha das despesas pessoais do delegado, localizadas na casa de Mário Franklin Leite Mustrange de Carvalho, o Marinho, secretário particular de Álvaro. O documento foi achado durante cumprimento do mandado de busca e apreensão 0041.000214-9/2006, expedido pela 4ª Vara Federal Criminal, no dia 15 de dezembro de 2006, durante a Operação Gladiador.

A lista revela que Álvaro já possuía despesa mensal de mais de R$ 25 mil, fora compras feitas à vista, como um Toyota Corolla blindado de R$ 113.800, na concessionária Inter Japan. A nota fiscal indica que foram pagos R$ 58 mil, além de um Santana. O Toyota está em nome de Francis Bullos, mas o boleto da seguradora registra o nome de Lins, com endereço de Marinho, o que, para a PF, mostra que o verdadeiro dono do veículo é o deputado.

Também foi encontrado comprovante de pagamento de R$ 6.794 da H.Stern, com garantia em nome de Lins, relativo à compra de um brinco de ouro 18 quilates, com brilhante solitário, anel e caneta de ouro.

Os policiais encontraram contas de condomínio de dois apartamentos em Copacabana — uma de R$ 220, na R. Santa Clara, e outra de R$ 1.200, na R. 5 de Julho —; de uma no Grajaú, de R$ 260; e de casa em Itaipava, de R$ 650. Na relação também há contas de luz e gás dos imóveis, da faculdade da ex-mulher, Luciana Gouveia dos Santos, dos colégios dos dois filhos do casal (R$ 1.727), de plano de saúde, Internet e de rede de loja de departamento. Só com despesas de empregados na casa de Itaipava, o delegado gastava R$ 2.302.

Os documentos apreendidos na residência de Lins serão usados para mapear seu verdadeiro patrimônio.

Propinas também no comércio

Um dos principais pilares do esquema da quadrilha de Álvaro Lins eram as grandes redes de supermercados. Em troca de pagamentos mensais de propinas, esses estabelecimentos tinham a garantia de que, enquanto atuassem como ‘colaboradoras’, ficariam fora de autuações e apreensões policiais e seus funcionários nunca seriam alvo de investigações. O acordo era tão seguido à risca que o delegado que encontrasse irregularidades em uma dessas empresas era punido pela cúpula da Polícia Civil.
Num demonstração da força do esquema, um delegado foi afastado após ter prendido em flagrante o gerente de uma das filiais de uma “colaboradora”, em 2003. À frente da Delegacia do Consumidor, ele foi informado que o estabelecimento ao qual havia causado o transtorno dava ajuda ao programa Cheque-Cidadão, da governadora Rosinha Garotinho.

Uma outra rede de supermercados teve a carga apreendida liberada após interferência de Fábio de Menezes de Leão, o Fabinho, um dos homens forte de Álvaro Lins e responsável em pegar o dinheiro destinado às ‘caixinhas’. Os produtos da empresa foram recolhidos durante uma operação da Delegacia de Roubos e Furtos de Cargas.

As propinas do comércio formal se somavam ao dinheiro arrecadado com negócios ilícitos, como bingos e jogo do bicho, e ao de várias fontes de corrupção para alimentar o esquema. Para o Ministério Público Federal, todo o fluxo de recursos tinha como objetivo levantar fundos para custear campanhas eleitorais.

EVOLUÇÃO DE PATRIMÔNIO TRANSFERIDA PARA PARENTES E AMIGOS

Usada como laranja, Luciana, ex-mulher de Lins, adquiriu à vista, em 10 de fevereiro de 2006, um imóvel na Rua Paula Freitas, em Copacabana, por R$ 450 mil. Com a quebra de sigilo fiscal, ficou constatada a incompatibilidade dos rendimentos de Luciana com a transação. Para justificar a aquisição, Luciana declarou a venda de um imóvel na Rua Ponte Nova, em Campo Grande, em janeiro de 2006, pelo valor de R$ 300 mil — não há, no entanto, o nome do comprador.

Francis Bullos, atual sogro de Lins, também está entre os laranjas. Vereador em Barra Mansa, ele era um importante braço político de Álvaro na região. Na declaração de Imposto de Renda referente ao ano de 2002, sua relação de bens totalizava R$ 148.726,23. Já em 2007, quando Álvaro já estava com Sissy, Bullos tem um patrimônio de R$ 1.162.670,16. Ele também passa a declarar, a partir daí, jóias e gravuras avaliadas em R$ 110 mil e R$ 150 mil em espécie.

O DIA Online

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